O governo de Jair Bolsonaro estuda lançar um “pacote de
combate ao desemprego” que reúne diversas ações que pretendem criar condições
que permitam aos empregadores criarem vagas de trabalho. O conjunto de
propostas já vem sendo anunciado pela mídia desde a semana passada, mas apenas
banqueiros e executivos tiveram acesso às propostas elaboradas pelo ministro da
Economia, Paulo Guedes, que deve, com aval desses setores, anunciá-las nos
próximos dias.
Mas, na análise o diretor-técnico do Dieese, Clemente Ganz
Lúcio, o que se sabe desse pacote “talvez tenha uma baixa eficácia”, como
afirmou em entrevista à jornalista Marilu Cabañas, da Rádio Brasil Atual. Para
CLemente, o pacote coloca quase que diretamente o trabalhador como responsável
pela falta de postos de trabalho e, ao fazer isso, desconsidera as condições da
própria economia brasileira. “Porque a dinâmica econômica não é favorável para
a criação de vagas”, ressalta Clemente.
As medidas do governo envolvem a liberação de R$ 65 bilhões
de depósitos recursais para as empresas financiarem o capital de giro. Ou seja,
os valores que hoje estão depositados em juízo para que as companhias arquem
com questões trabalhistas, serão liberados desde que elas façam um seguro para
compensar a reserva desse recurso para o caso de perderem uma ação na Justiça
do Trabalho e assim possam indenizar ex-funcionários.
Outra ação prevista é uma tentativa de organizar uma
parceria público-privada para a intermediação de mão de obra. Na prática, essa
proposta desloca para as empresas do setor privado o trabalho de agência de
emprego, que estão a cargo do Sistema Nacional de Emprego (Sine), responsável
desde 1975 por esse trabalho, com aporte de recursos públicos. “(Isso é) para
que a intermediação seja pública e não privada, mas o governo Bolsonaro prevê
justamente o contrário: ampliar e apoiar a intermediação privada de alocação de
pessoas em postos de trabalho”, critica Clemente.
O diretor-técnico do Dieese também contesta a proposta do
governo de promover algumas facilidades para que o desempregado se qualifique.
Clemente destaca que de fato a formação é um problema para hora da disputa por
uma vaga, mas cursos de curta duração, como oferta a equipe econômica, não
resultam na qualificação do trabalhador. “Um programa de formação mais extenso,
continuado, articulado com o setor empresarial tem se demonstrado muito mais
eficaz, coisas que o sistema S faz com maior efetividade”, avalia.
Também é criticável para o especialista duas medidas que
preveem estímulos para que as empresas façam algum tipo de investimento em
termos de formação, como a redução do PIS/Pasep que os empregadores recolhem,
ou ainda da instituição do chamado “emprego verde e amarelo”, que permitirá a
desoneração da folha de pagamento e uma redução de 50% no Fundo de Garantia por
Tempo de Serviço (FGTS) às empresas que contratarem um jovem ou profissional
desempregado. “O risco disso é que tenhamos uma rotatividade perversa. As
empresas demitindo trabalhadores que são contratados pela CLT (Consolidação das
Leis do Trabalho), para contratar desempregados ou jovens, com estímulo fiscal,
pagando portanto menos tributos. Numa condição em que a economia apresenta
grave distorção em termos de desemprego, esse tipo de iniciativa pode
incentivar uma rotatividade perversa”, alerta o especialista do Dieese.
O plano de aquecimento do mercado de trabalho também deve
prever a reformulação das regras para o microempreendedor individual (MEI),
modalidade usada por trabalhadores autônomos que, com o pacote, poderão
contratar até duas pessoas com novas faixas de limite e contribuição, e a
reformulação do Sine, que além da junção com o setor privado teria seus
serviços informatizados. O desenho das medidas também visa reabilitar
trabalhadores afastados por problemas de saúde ou acidente, como programas de
reabilitação para quem é faz uso problemático de substâncias psicoativas. “É um
problema social importante a ser atacado, mas com baixo impacto sobre a criação
do emprego”, explica Clemente.
Das medidas previstas, a única que o diretor-técnico destaca
positivamente é a ampliação do microcrédito para as comunidades e trabalhadores
autônomos que não têm capacidade de comprovação de renda, o que de acordo com
ele pode contribuir para que profissionais que precisam de algum tipo de
crédito alavanquem sua atividade econômica e, portanto, beneficiem o país.
Mas, numa análise geral, Clemente destaca que o pacote, que
utilizará ainda recursos do Sistema S, não enfrentará de maneira estrutural o
problema da falta de postos de trabalho, que atinge hoje 12,6 milhões de
pessoas, principalmente por distorcer políticas públicas e promover a
privatização. “Não serão essas as medidas que enfrentarão esse grave problema
do desemprego”, sintetiza.
Fonte: RBA