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MANIFESTO DOS ECONOMISTAS PARANAENSES CONTRA A PRIVATIZAÇÃO DA COPEL – PELA PARALISAÇÃO DO PROCESSO DE PRIVATIZAÇÃO




Introdução – Privatização da Copel

A Associação Brasileira dos Economistas pela Democracia – Regional Paraná (ABED-PR), vem por meio deste documento manifestar seu desacordo em relação ao processo de privatização da Copel, solicitando que o processo seja paralisado e que sejam realizados debates com a sociedade paranaense.

O discurso fácil da defesa do “Estado Mínimo”, da privatização de empresas estratégicas, da suposta ineficiência na gestão realizada pelo setor público, se repete no momento deixando um clima de aparente déjà vu, parecendo que adentramos a uma máquina do tempo dos filmes de ficção cientifica e que fomos transportados para o passado – passado este que esperávamos já ter sepultado e que não voltaria mais para assombrar a população paranaense. No início dos anos do 2000, o então governo Jaime Lerner (1995-2002), preparava a venda Copel (Companhia Paranaense de Energia), a tentativa foi barrada em 2001 após uma ampla mobilização social, vitória histórica para o povo paranaense – relembrada e comemorada até os dias atuais. Passados mais de 20 anos, o tema da privatização da maior e mais importante empresa do Paraná volta novamente à tona.

Na última semana, a sociedade paranaense foi pega de surpresa, na última segunda-feira (21/11/2022) através da divulgação de um “Fato Relevante”[1] para o mercado financeiro, o governo do Estado do Paraná anunciou a sua intenção de privatizar a Copel, empresa criada em 1954 durante o governo de Bento Munhoz da Rocha Netto, e que está prestes a completar sete décadas de existência.

Atualmente, a proposta do governo do Estado permitiria a redução da sua participação acionária na empresa para até 15,00%, atualmente é de 31,07%, e nas ações ordinárias, com direito a voto, para até 10,00%. que hoje é de 69,66%, estabelecendo algumas condicionantes, como: vedar que qualquer acionista ou grupo de acionistas exerça votos em número superior a 10% (dez por cento) da quantidade de ações com direito a voto; veda a realização de acordos de acionistas para o exercício de direito de voto, exceto para a formação de blocos com número de votos inferior ao limite de 10%; inclui a obrigação de manter a sede da empresa no Estado do Paraná; inclui ainda a obrigação de não alterar a denominação da COPEL; e criar ação preferencial de classe especial, de propriedade exclusiva do Estado do Paraná, que conferirá o poder de veto nas deliberações da assembleia geral relacionadas à algumas matérias.

Pelas projeções realizadas e divulgadas pela empresa, a venda das ações pode gerar a arrecadação entre R$ 2,5 bilhões e R$ 3,1 bilhões, valor similar a distribuição de dividendos realizada pela empresa referente ao ano de 2021, que foi de R$ 3,088 bilhões, e equivalente a cinco anos da média de dividendos recebido pelo Governo do Estado nos últimos três anos, na qual a média anual foi de R$ 618,8 milhões.

Falta de debates com a sociedade
Por se tratar de uma empresa estratégica, a maior empresa do estado do Paraná e uma das maiores do Setor Elétrico Brasileiro (SEB), era de se esperar que este processo ocorresse de forma transparente, democrática, com ampla divulgação para a sociedade paranaense, e com o tempo necessário para elaboração e a apresentação de estudos técnicos, bem como com a realização de debates, audiências públicas, entre outros, espaços nos quais os paranaenses pudessem não somente entender o que está ocorrendo neste momento, mas também tivessem a oportunidade de se manifestar a respeito.

Infelizmente não é o que se verifica na prática, o Projeto de Lei que trata da privatização foi encaminhado às pressas para a Assembleia Legislativa do Estado do Paraná (ALEP-PR), votado em regime de urgência e aprovado (seguindo na sequência para sanção do governador), sem os necessários debates com a sociedade paranaense, inclusive recebendo fortes críticas dos parlamentares, que indicaram não terem tido tempo hábil para analisar a proposta de forma aprofundada, como seria necessário, ainda mais se tratando de uma tema complexo e que irá impactar toda a população. A título de comparação, somente neste ano, até o último dia 25/11, a ALEP-PR realizou 45 audiências públicas sobre os mais diversos temas de interesse da sociedade, que ocorreram com a participação da população, bem como também de especialistas das respectivas áreas. No entanto, nenhuma audiência foi agendada para debater a privatização da Copel. Destaca-se que até mesmo o Ministério Público do Trabalho no Paraná (MPT-PR),[2] encaminhou requerimento ao governador do Estado e a Assembleia, solicitando a realização de audiência para discutir os impactos da privatização da Copel, mas a solicitação do órgão não foi atendida.

Privatização e a Usina Hidrelétrica de Foz do Areia
A Usina Hidrelétrica de Foz do Areia (Usina Governador Munhoz da Rocha Netto), é a maior usina da Copel, possui 1.676 MW de capacidade instalada, está localizada no rio Iguaçu, no município de Pinhão na região Centro-Sul do Paraná. Representantes da Copel e do governo do Estado defendem que é preciso privatizar a empresa para que seja possível manter o controle da usina de Foz do Areia. Os decretos federais 9.271 de 2018[3] e 10.135 de 2019[4], regulamentam a outorga de contrato de concessão no setor elétrico associada à privatização de titular de concessão de serviço público de geração de energia elétrica.

Estes dispositivos legais indicam que para a renovação das concessões que se encerrarão, é necessário que ocorra a privatização do ativo em questão (e não a privatização da empresa e/ou do grupo/holding) mediante a transferência do controle acionário, na qual o novo administrador do ativo seria uma empresa privada. Outro aspecto a ser destacado na legislação, é a alteração do regime de geração de energia, que deverá passar de serviço público (como é atualmente na usina de Foz do Areia), para a produção de energia elétrica. Além disso, caberia ao vencedor o pagamento de um valor de outorga para ter direito a uma concessão com o prazo de vigência de 30 anos.

Todavia, para as atuais detentoras dos ativos existe sim a possibilidade de mantê-los, como será explicado a seguir, ainda que não sejam empresas privadas, ou seja, não é necessário a privatização de empresas que estejam sob o controle acionário do um ente público, como é o caso da Copel. Ocorrendo ou não o processo de privatização, para que seja possível manter a concessão de Foz do Areia por 30 anos, é preciso realizar manifestação indicando o interesse em manter o ativo e ainda aceitar a alteração do regime de energia para produtor de energia elétrica. Todavia, para que um interessado no ativo possa ser considerado como privado é preciso que o consórcio tenha uma empresa privada como acionista majoritário (51%), podendo, consequentemente o minoritário (49%) ser uma empresa que tenha como o seu acionista majoritário um ente público, como é o caso da Copel.

Portanto, de acordo com o previsto na legislação citada acima, seria possível para a Copel estabelecer uma parceria com uma empresa privada, em um formato de consórcio, a exemplo do que já fez em outros momentos para a disputa de leilões e desta forma, manter a usina de Foz do Areia por 30 anos, ainda que seja como acionista minoritário – o que também já ocorreu por diversas oportunidades, com a Copel disputando leilões ou até mesmo vencendo certames colocada como acionista minoritária dos empreendimentos. Esta possibilidade de privatizar somente a usina, para não perder o controle da companhia, foi aventada pela Copel, conforme indicado pelo próprio presidente da companhia[5]. Nestas condições a usina não precisaria passar por um leilão quando do vencimento da concessão que ocorrerá em 21 de dezembro de 2024.

Analisando as demonstrações contábeis da Copel referentes ao ano de 2021, verificamos que a Receita Operacional Líquida da companhia foi de R$ 24,0 bilhões, destas receitas, o equivalente a 25,8% se originou no setor de geração, correspondendo a R$ 6,2 bilhões. Portanto, considerando que a UHE de Foz do Areia responde por 25% da capacidade instalada de geração da companhia (hidrelétricas, térmicas e eólicas), podemos inferir de modo hipotético (a despeito dos fatores que possam interferir no nível de utilização da capacidade instalada das usinas), que ela seria responsável por cerca de 6,5% da receita total auferida pela Copel – se considerarmos neste exercício hipotético a garantia física da usina, a participação sobre as receitas seria ainda menor.

Portanto, cabe questionar, mesmo sendo uma usina importante para Copel, é plausível se privatizar todo um grupo econômico estratégico, que é composto não somente por geração de energia, mas também por transmissão e distribuição, para manter um ativo que representa menos de 7% da receita da companhia? Perder o controle desta companhia estratégica somente para manter uma usina? Para que fique clara e evidente nossa posição em relação ao tema e que não existam eventuais questionamentos sobre esta argumentação, não estamos defendendo que a Copel simplesmente desista de Foz do Areia, não é isso, o que estamos indicando é a existência de uma outra possibilidade, que poderia ser menos danosa ao grupo Copel.

Desta maneira, a Copel permaneceria como acionista de Foz do Areia, ainda que fosse de forma minoritária, por outro lado, nesta hipótese o governo do Estado continuaria sendo acionista majoritário do grupo Copel. Parece que está ocorrendo neste processo de privatização uma inversão de prioridades, tem-se a preocupação em não perder o controle acionário de uma usina, mas não parece causar preocupação entre os envolvidos a perda do controle acionário do grupo.

 Além disso, as demais usinas citadas pela companhia para justificar o processo de privatização, UHE Governador Ney Braga (Segredo) e UHE Governador José Richa (Salto Caxias), são ativos que terão seus contratos vencendo somente em setembro de 2032 e março de 2033, respectivamente. Portanto, até que estes contratos estejam para vencer, decorrerá cerca de uma década, consequentemente um longo período, em que as políticas setoriais e o marco regulatório do setor elétrico poderão ser alterados – não havendo motivos neste momento para se antecipar.

O que leva um governo a privatizar uma empresa lucrativa e altamente rentável?
Observa-se que desde o início do governo atual, o Lucro Líquido da companhia apresentou crescimento de 249,63%, saltando de R$ 1,4 bilhão em 2018 para R$ 5,0 bilhões em 2021, neste mesmo período, a Receita Operacional líquida teve incremento de 60,59% atingindo R$ 24 bilhões, os investimentos, que são sempre colocados como prioritários pela empresa e pelo governo do Estado (ao menos nos discursos para a mídia), tiveram redução de 15,18%, passando de R$ 2,6 bilhões para R$ 2,2 bilhões. Em 2016, portanto, antes da venda Copel Telecom, a companhia chegou a investir R$ 3,6 bilhões, porém, nos anos seguintes assiste-se a redução sistemática dos investimentos realizados.

Cabe lembrar que, o governo do Estado preconizava que, com a venda da Copel Telecom sobrariam mais recursos para ampliar os investimentos do grupo Copel, naqueles que eram considerados os seus “negócios chave”, no caso a área de energia, efetivamente pelo exame dos dados não foi o que ocorreu, o que se viu na prática, foi que parte expressiva dos recursos acabou sendo destinada para a distribuição de dividendos para os acionistas como “excedente” de caixa[6] – e os investimentos caíram.

A Copel e o mercado financeiro
Demonstrando claramente a lógica de financeirização da empresa e a mercantilização dos serviços iniciada na última década e que foi aprofundada recentemente, durante o mandato do atual governo (2019-2021), os dividendos distribuídos aos acionistas cresceram expressivos 715,89%! saltando de R$ 378,5 milhões em 2018 para R$ 3,1 bilhões em 2021, os proventos destinados ao mercado financeiro que representavam 26,2% do Lucro Líquido, passaram a responder por 61,2% do Lucro Líquido. Considerando os três anos de mandato do governo atual  (2019 a 2021), o montante total destinado aos acionistas (nacionais e estrangeiros) totalizou R$ 6,3 bilhões, os maiores valores da história da empresa, o que equivale a 65% do total distribuído entre 2011 e 2021 (R$ 9,6 bilhões) [7].  Devemos ressaltar que, atualmente, uma expressiva parcela do capital da companhia já está sob o poder do mercado financeiro, os acionistas privados (B3, NYSE e LATIBEX) respondem por 61,7% das ações preferenciais.

Segundo levantamento realizado pela consultoria Economática[8], em 2021, a Copel situou-se entre as maiores pagadoras de dividendos do país entre as empresas listadas na Bolsa de Valores, mantendo-se como umas das empresas mais atrativas do mercado financeiro. Em caso de concretização do processo de privatização este cenário poderá se agravar ainda mais, com a possibilidade de um volume ainda maior de recursos sendo destinados para o mercado financeiro.

A privatização e as finanças públicas do Estado
Um dos argumentos preconizados para defender a privatização da Copel é o de que, com a venda das ações da empresa, os recursos gerados serão utilizados para alavancar os investimentos do poder executivo. Todavia, não nos parece uma justificativa plausível e que não está ancorada na realidade das finanças públicas do Estado.

De acordo com o material técnico elaborado pelo Conselho de Controle das Empresas Estatais (CCEE), as receitas do Estado não estariam apresentando crescimento considerável no nos últimos cinco nos. Todavia, utilizar como referência para a análise o período recente e buscar indicar uma tendência para o futuro, não nos parece não ser o mais adequado. Em função de um cenário econômico marcado por uma crise econômica e política no biênio 2015-2016, e mais recente devido a uma grave crise econômica e sanitária decorrente da pandemia do novo coronavírus, a atividade econômica no país foi severamente afetada, afetando diretamente a arrecadação nas diversas esferas de governo, inclusive do próprio Estado do Paraná.

A análise realizada considera em seus cálculos somente as Receitas Tributárias, no entanto, devemos destacar que as Receitas Correntes do executivo são compostas não somente pelas tributárias, mas também, por exemplo, de transferências correntes e outras receitas correntes, estas duas que inclusive tiveram crescimento expressivo nos últimos anos, ampliando sua participação sobre as receitas. Além disso, verificamos que na comparação de 2021 sobre 2018 as Receitas Correntes tiveram ampliação de 28,3% – contra uma inflação de 19,99% (IPCA).

As previsões de perdas de receita da SEFA não têm se concretizado, muito pelo contrário, estamos observando excesso de arrecadação e aumento da disponibilidade de caixa, o Estado tem dinheiro – R$ 11 bilhões em caixa – não tem projetos de investimento e planejamento de gastos com políticas pública, utilizar essa análise para justificar a venda da Copel e com isso ter recursos para investimento não se sustenta.

Além disso, não podemos deixar de ressaltar que o aumento de receitas proveniente do processo de privatização da Copel terá impacto temporário no caixa do Estado, uma receita considerada atípica. A política de se utilizar da venda de ativos estratégicos para aumentar as receitas do executivo, não parece uma estratégia sustentável, nem mesmo coerente e até mesmo caracterizada pela contradição. Considerando esta lógica, cabe questionar, o que ocorreria se todos os entes públicos necessitassem vender seus ativos para realizar investimentos? E aqueles que não os possuem ou que já os privatizaram? Estes municípios e/ou estados não realizarão investimentos necessários para a sua população? Dependerão exclusivamente desta fonte de recursos?

O estudo do CCEE ainda indica que, o Rio Grande do Sul seria um exemplo exitoso no processo de venda de ativos estratégicos, no entanto, é apresentada uma tabela comparando os investimentos realizados pelos estados em comparação com as respectivas receitas totais até o 4° bimestre de 2022, nesta classificação o estado gaúcho, ficou na 26° colocação, parece que a venda de ativos não levou ao aumento dos investimentos.

Certamente que o nível de investimento público no Paraná é baixo quando se compara com indicadores como receitas, Produto Interno Bruto (PIB), entre outros, ou mesmo em comparação com outras unidades da federação, mas este cenário já ocorre há muitos anos. No entanto, não será através da venda de ativos estratégicos que essa deficiência será resolvida. Para tanto, torna-se necessário uma melhoria na gestão e no planejamento na alocação dos recursos públicos para que os investimentos passem a ser de fato prioritários no Paraná.

Se o governo alega que possui dificuldades de caixa e necessita de recursos para realizar investimentos públicos, cabe questionar por que as renúncias fiscais se elevam ano após ano, batendo sucessivos recordes, reduzindo o potencial de arrecadação das receitas. No período de 2018 a 2022, as renúncias fiscais do governo ultrapassaram R$ 55 bilhões, sendo que a previsão para 2023, conforme PLOA (Proposta de Lei Orçamentária Anual) é de que as renúncias atinjam expressivos R$ 16,1 bilhões, totalizando mais de R$ 70 bilhões em seis anos! No comparativo de 2023 (R$ 16,1 bilhões) sobre R$ 2018 (R$ 10,0 bilhões) as renúncias tiveram aumento de 60,6%.

Impactos da privatização na gestão da empresa
Destaca-se ainda que, com a redução da participação na composição acionária da Copel, o estado do Paraná terá não somente uma diminuição expressiva no montante de dividendos que passará a receber nos próximos anos, mas também terá outra perda relevante, com uma menor participação acionária, o Estado perderá espaço na gestão da empresa, com a redução no número de conselheiros e diretores que poderá indicar na empresa. Desta forma, reduzirá o seu poder de influência sobre a empresa, em decisões importantes para o futuro da companhia, e para os consumidores, como por exemplo, em relação as tarifas, os novos investimentos, a qualidade dos serviços para os clientes, ou ainda a importante (e fundamental) discussão em relação a transição da matriz energética (que nos países desenvolvidos tem sido capitaneadas pelo setor público, inclusive com recursos vultuosos), limitando ainda a sua utilização nas políticas públicas do estado (econômicas e sociais), principalmente para a população mais necessitada.

Quem paga a conta da privatização?

1. Tarifa para os consumidores

Na década de 90, se iniciou no Brasil um amplo programa de privatizações, inclusive com impactos no setor elétrico. Como resultante deste processo, observou-se o aumento expressivo das contas de energia, muito acima da inflação mensurada pelo IBGE. Entre 1995 e 2019, a inflação apresentou variação de 458,28%, enquanto o item energia elétrica residencial subiu 1.020,09%[9]. Destaca-se que o processo de privatização levou ao encarecimento não somente das contas de energia para a população de um modo geral, que sentiram no bolso os efeitos da privatização, reduzindo seu poder aquisito, mas também afetou o setor empresarial, que viu os seus custos de produção aumentarem significativamente em decorrência de aumento das tarifas, influenciando diretamente para a majoração dos preços de produtos e serviços repassados para os consumidores finais.

2. Trabalhadores da Copel

Os trabalhadores da Copel também têm sofrido com o desmanche ocorrido na empresa nos últimos, em 2012 a empresa possuía 9.468 trabalhadores em seu quadro próprio (sem considerar as empresas coligadas), desde então, o número tem se reduzido de forma significativa, em setembro de 2022 atingiu apenas 5.902 trabalhadores, redução de 38%, com a eliminação 3,6 mil postos de trabalho! E deverá se reduzir ainda mais nos próximos anos. Por outro lado, entre 2012 e 2021 o número de trabalhadores terceirizados cresceu expressivamente, passando de 5.524 para 8.420, aumento de 52,4% – sendo que a partir de 2019 o contingente de trabalhadores terceirizados ultrapassou o total de trabalhadores existentes no quadro próprio, em que os terceiros já respondem por 56% do total do quadro de trabalhadores.

Além disso, observa-se que a riqueza gerada pela Copel, aferida pelo Demonstrativo do Valor Adicionado (DVA) constante das Demonstrações Contábeis da empresa, se ampliou entre 2018 e 2021, com crescimento de 58,8%, saltando de R$ 13,4 bilhões para R$ 21,2 bilhões. No entanto, apesar do aumento significativo observado, a participação dos trabalhadores sobre o total da riqueza distribuída pela empresa se reduziu, era de 10,9% em 2018 e caiu para 7,8% em 2021. Neste mesmo período, a participação dos acionistas subiu de 10,8% para 18,2%, chegando a atingir 25,5% do total em 2020.

Em se concretizando o processo de privatização, certamente se assistirá a um movimento ainda mais agressivo de redução do número de trabalhadores da empresa, analisando as experiências de privatização ocorridas no setor elétrico, nota-se que o processo é marcado pela implementação quase que imediata de  Programas de Demissão Voluntária (PDVs), inclusive verificado nos processos recentes de privatização da Eletrobras e suas subsidiárias, com o corte expressivo da mão de obra, reduzindo custos para a empresa.  Além disso, verifica-se um movimento no sentido de reduzir (ou até mesmo eliminar) os direitos e benefícios conquistados ao longo do tempo nas negociações coletivas entre a empresa e as entidades sindicais, inclusive os que constam atualmente no Acordo Coletivo de Trabalho (ACT).

Em junho de 2022, a Eletrobras, citada recorrentemente como exemplo para a venda da Copel, finalizou o seu processo de privatização, poucos meses depois, uma das primeiras medidas anunciadas pela companhia, em outubro deste ano foi o lançamento de um PDV, que prevê a demissão de 2,3 mil trabalhadores do seu quadro, [10] atualmente possui pouco mais de 10 mil trabalhadores. Anteriormente, no período de 2016 a 2020, em decorrência dos contínuos planos de demissões e de aposentadorias incentivas com vistas a privatização, foram eliminados 10,7 mil empregos, reduzindo praticamente pela metade o seu quadro de pessoal neste período, que caiu de 24,5 mil para 13,8 mil trabalhadores[11].

Os processos de privatização que ocorreram no setor elétrico nas últimas décadas sempre tiveram uma característica em comum: a demissão expressiva de trabalhadores, com a redução do quadro de trabalhadores, ou ainda a substituição dos trabalhadores do quadro próprio por trabalhadores terceirizados – resultando na precarização das condições de trabalho e na qualidade dos serviços prestados.

Privatização da Copel: Na contramão do mundo
A decisão do governo do Estado do Paraná de privatizar a Copel está na contramão do que se observa em todo mundo, tem sido prática recorrente por parte de governos a reestatização de empresas de setores estratégicos, processo que inclusive se ampliou durante a pandemia. Em 2020, o Instituto Transnacional (TNI) publicou estudo[12], que apresenta um levantamento de 1.408 casos bem-sucedidos de remunicipalização e de municipalização/criação de serviços públicos em diversos setores de atividade econômica no período de 2000 a 2019, envolvendo 2.400 cidades em 58 países, com destaque para as ocorrências verificadas em países desenvolvidos. O setor de energia é o que possui mais casos de remunicipalização, com 374, representando 27% do total. Destaque para Alemanha que concentrou 305 casos, equivalente a 82%, seguido por Espanha (18), Reino Unido (13) e Estados Unidos (11).

Entre as principais justificativas para a retomada dos serviços pelo poder público estão: redução de tarifas, democratização do acesso aos serviços de energia, inclusive sob a perspectiva da transição da matriz energética, bem como a ampliação da participação e do controle social.

Considerações finais – Pela Revogação da venda da Copel

Considerando que:

– O rito legislativo ocorreu em um prazo de apenas quatro dias para o Projeto de Lei ser apreciado e votado, sem permitir tempo para discussão e divulgação mínima junto a sociedade de uma decisão de relevante importância estratégica para o Estado;

– Pelo fato de a Copel ser uma das empresas com excelentes resultados financeiros em suas demonstrações contábeis, entre as mais lucrativas do setor elétrico;

– Ser a Copel prestadora de um serviço básico, essencial e de boa qualidade, e a necessidade de manter essas condições para o futuro;

– A experiência nacional e internacional demonstra de que a privatização, em muitas situações, redundou em aumento dos preços dos serviços prestados e queda da qualidade;

– A redução sistemática do número de trabalhadores, com um processo de precarização das condições de trabalho;

– Possibilidade de mudanças dos marcos regulatórios com a política energética do novo governo federal;

– A capacidade do governo estadual continuar definindo a estratégia de investimento da Copel voltada a interesses das políticas públicas, sociais e de desenvolvimento do Estado;

– As condições financeiras do Estado – aumentar investimentos com os seus recursos próprios em caixa, oriundo dos excessos de arrecadação dos últimos anos;

– Destaca-se que não é necessário que a Copel seja privatizada para que mantenha participação na usina de Foz do Areia;

O Governo do Paraná sem dúvida tomou uma decisão precipitada e que compromete o futuro da Copel e afetará significativamente as decisões estratégicas do Estado no campo da energia, políticas públicas e de desenvolvimento do Estado.

Diante de um cenário de eminentes de mudanças nas definições governamentais da política nacional de energia, essa decisão é intempestiva e poderá gerar danos de difícil reversão.

A Associação Brasileira dos Economistas – ABED/Seção Paraná indica a revogação da medida de venda da Copel

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ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DOS ECONOMISTAS PELA DEMOCRACIA – SEÇÃO PARANÁ (ABED-PR)

Estudo Elaborado pelos Economistas Associados da ABED-PR:
Sandro Silva (Elaboração Técnica)
Cid Cordeiro Silva (Revisão Técnica)
Sérgio Guimarães Hardy (Revisão Técnica)

FONTE: https://economistaspelademocracia.org.br/2022/11/29/manifesto-contra-privatizacao-copel/

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