Paira sobre o setor de saneamento no Brasil uma grave
ameaça. Trata-se do relatório do deputado Geninho Zuliani (DEM/SP), a partir do
projeto de lei 3261/19, de autoria do senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), que
desmonta o marco regulatório existente e não põe outro de pé. Se aprovada, a
proposta ocasionará insegurança jurídica, porque extingue os contratos em
vigor, subtrai prerrogativas constitucionais dos municípios (titulares do
serviço) e obriga empresas públicas a fazer parcerias público-privadas.
Isso levará o setor, inevitavelmente, à paralisia, em razão
de um virtual emaranhado de recursos judiciais. Pior, haverá depreciação de
ativos das empresas estaduais, o que levará à quebradeira geral no sistema,
desabastecimento e majoração de tarifas. Por isso, apesar do fortíssimo lobby
favorável de segmentos econômicos, o PL 3261/19, sustentado pelo relatório de
Geninho Zuliani tem recebido objeção da quase totalidade dos governadores e de
todas entidades sérias que atuam no setor.
O PL que gerou o relatório, já aprovado na Comissão Especial
da Câmara, reedita o conteúdo de duas Medidas Provisórias do governo Temer (844
e 868). Ambas, mesmo aprovadas nas respectivas Comissões Mistas, foram
derrotadas no plenário da Câmara.
O argumento dos defensores do “novo marco regulatório” é que
a participação do setor privado é reduzida, quase inexistente, por causa dos
contratos de programa e de prestação de serviço por empresas estaduais. Alegam
que a privatização das estatais e a garantia de empresas privadas herdarem os
atuais contratos de programa convertendo-os em contratos de concessão vai
assegurar investimentos privados diretos e a universalização do serviço. A
realidade é exatamente oposta, o PL 3261/19, e o relatório de Zuliani,
inviabilizarão investimentos.
De fato, o déficit de cobertura no setor decorre da ausência
de investimentos. A solução é o Estado brasileiro disponibilizar recursos do
Orçamento Geral da União (OGU) para investimentos não onerosos nos sistemas
autônomos municipais e nos sistemas operados pelas empresas públicas estaduais,
com prioridades para sistemas deficitários. Ofertar linhas de crédito com taxas
de juros de longo prazo atrativas para as empresas privadas que já atuam, ou
que vierem a atuar, no setor. Só houve disponibilidade de recursos durante a
vigência do Planasa (1965-1985) e mais recentemente, no PAC (2007-2014).
Empresas privadas operam, atualmente, 322 sistemas no
Brasil. O marco regulatório atual não impede a atuação de empresas privadas no
setor de saneamento, ao contrário, a participação no setor está sustentada em
um robusto marco regulatório que garante segurança jurídica, tanto para a
participação privada, como para a pública.
Constitucionalmente, o titular do serviço é o município, que
pode prestar o serviço diretamente por meio de autarquia ou empresa própria;
licitar para selecionar empresa privada a prestar o serviço; ou contratar
empresa estadual, sem licitação, através de contrato de programa.
O PL 3261/19 desmonta o marco regulatório atual e carrega
enorme insegurança jurídica quando, por exemplo, permite que após aquisição de
empresas públicas, empresas privadas possam transformar os atuais contratos de
programa (que só podem ser celebrados entre entes públicos) em contratos de
concessão (que devem ser precedidos de processo licitatório).
Atualização
Fonte: Ondas